- Da exclusão do crédito tributário: Considerações Iniciais
A exclusão do crédito tributário[1] consiste na inviabilidade de sua constituição, ou seja, são situações em que, mesmo ocorrido o fato gerador e a obrigação tributária, não haverá lançamento e, consequentemente, não haverá o crédito tributário.
A exclusão do crédito tributário pode se dar por meio da isenção ou da anistia, hipóteses essas que consistem em renúncia fiscal devendo serem instituídas com atenção às disposições da Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF.
O poder de isentar/anistiar é inerente ao poder de criar tributos ou exigir penalidade. Desse modo, um Ente Político (União, Estado, DF ou Município) somente poderá, em virtude da separação constitucional de competências tributárias, isentar/anistiar tributo de sua própria competência.
Assim, isenção e anistia são normas desonerativas de deveres patrimoniais do contribuinte, atingindo-se o tributo, no caso de uma lei isentiva ou a multa, no caso de uma lei anistiadora.
É importante registar que a motivação do legislador para pretender isentar um tributo não é a mesma que o leva a anistiar uma penalidade. A isenção se justifica no plano socioeconômico da realidade social que a invoca, enquanto a anistia encontra fundamento no interesse do legislador em retirar o timbre de impontualidade do inadimplente da obrigação tributária.
E, esse artigo versará somente sobre o instituto da isenção tributária, pelo que deixaremos de lado as discussões inerentes às hipóteses de exclusão por meio da anistia.
Ademais, apenas a título de esclarecimento, convém registrar, também, que as hipóteses de isenção não se confundem com o instituto da imunidade tributária. A imunidade é uma hipótese de não incidência tributária constitucionalmente qualificada. É uma limitação constitucional ao poder de tributar. Já a isenção pode ser considerada uma hipótese de não incidência legalmente qualificada ou a dispensa legal do pagamento de determinado tributo devido.
- Compreendendo o instituto da Isenção Tributária
Conforme brevemente esclarecido acima, a isenção consiste em uma norma infraconstitucional – uma Lei, consoante determina o art. 97 do Código Tributário Nacional – que exclui o crédito tributário, impedindo a incidência da norma de tributação do fato gerador (FG).
Isto é, antes do nascimento da obrigação jurídico-tributária (fato gerador – FG) deve haver disposição legal que exclua o crédito tributário que normalmente decorreria daquele FG. Por isso se diz que a lei exclui da tributação hipótese que constitucionalmente poderia ser tributada.
Nesse aspecto, fica ainda mais fácil compreender a distinção entre isenção e imunidade, na medida em que a isenção é a retirada, mediante lei, da possibilidade de tributar. Pode-se tributar, mas o ente federativo, por política de gestão pública, opta pela renúncia da receita. Enquanto a imunidade é a impossibilidade originária. Nesse caso, o ente jamais teve possibilidade/competência de tributar sobre aquele fato, uma vez que vedado pela Constituição da República Federativa do Brasil.
Vejamos as principais classificações de uma norma isentiva:
- Isenção Geral: aquela que decorre diretamente da lei, não dependendo de qualquer requerimento da parte interessada, nem de posterior ato administrativo;
Ex.: isenção de IR sobre rendimentos de caderneta de poupança.
- Isenção Específica: aquela que se efetiva mediante despacho da autoridade administrativa. Ou seja: uma vez editada a lei, a parte interessada deve requerer junto à Administração Pública a concessão do benefício mediante a comprovação do preenchimento dos requisitos necessários;
Ex.: isenção de IPVA para deficientes físicos que adquirirem veículos adaptados.
- Isenção Total: aquela concedida sem qualquer restrição para aquele tributo que pretende ser excluído;
Ex.: aposentado com casa de até X metros quadrados não paga IPTU.
- Isenção Parcial: aquele que vigora pela redução da base de cálculo, pelo entendimento do STF (RE 174.478. SP.05);
- Isenção Autônoma: aquela concedida pela mesma pessoa jurídica titular da competência de instituir e cobrar o tributo.
- Isenção Heterônoma: aquela concedida por lei de pessoa jurídica diversa daquela que é titular da competência para instituir e cobrar o tributo a que se refere. OBS.: Quanto à essa última classificação, a Constituição Federal, ao adotar o já mencionado sistema de separação de competências tributárias, proibiu sua concessão, excetuadas as seguintes hipóteses: a) tratados internacionais; b) ICMS exportação (art. 155, § 2º, XII, e), e c) ISS exportação (art. 156, § 3º, II).
Progredindo, vale registar que, para a doutrina[2] majoritária “a isenção é a dispensa do pagamento de um tributo devido em face da ocorrência de seu fato gerador e constitui exceção instituída por lei à regra jurídica da tributação”, conceito utilizado, inclusive, pelo STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI – n.º 286, de relatoria do Ilmo. Min. Maurício Corrêa.
Apesar de aparentemente pacificado o tema por conta desse antigo e consolidado posicionamento do STF, é importante entender melhor a discussão acerca da natureza jurídica da isenção tributária que oscila entre os parâmetros de incidência e não incidência da norma, especialmente em razão de suas consequências práticas.
Além disso, são crescentes as provas de concursos públicos que exigem dos candidatos raciocínio jurídico mais apurado, nem sempre com a necessidade de defender somente argumentos favoráveis ao Fisco. Embora possa parecer estritamente técnica, essa discussão não é meramente acadêmica. Existem repercussões práticas diversas a depender de qual teoria se filie para explicar esse fenômeno jurídico.
De forma sintetizada, acerca das duas principais correntes existentes sobre a temática sob análise, temos o seguinte:
- Primeira Corrente: Há incidência da lei tributária.
Essa corrente defende que a norma de isenção não afeta a lei de tributação. A norma isentiva, de fato, limita-se a dispensar o pagamento do tributo, o qual não deixa de incidir validamente. Assim, a concessão da isenção enseja a identificação de hipótese de incidência tributária associada à dispensa de pagamento;
- Segunda Corrente: Não há incidência da Lei tributária.
Essa segunda corrente, criticando a concepção anteriormente apresentada de uma “obrigação que não obriga”, entende que a norma isentiva suprime parcela da eficácia da norma de tributação, a resultar que o fato isento deixa de ser enquadrado como fato gerador de obrigação tributária.
A adoção pelo jurista de uma das teorias acima determinará seu entendimento quanto à eficácia no tempo da lei isentiva. A depender do que entenda o intérprete, diferente também será o seu entendimento sobre o momento de vigência da lei que revoga este benefício fiscal.
Deve-se registrar que não há impedimento, via de regra, à revogação de uma norma isentiva. O CTN prevê, em seu art. 178, que a isenção pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo, salvo se onerosa, ou seja, concedida por prazo certo e em função de determinadas condições.
De forma sistematizada, são as seguintes as consequências da adoção de cada uma das teorias ante a revogação de norma concessiva de isenção:
- Para os que se filiam à primeira corrente, como a isenção é mera dispensa de pagamento de tributo devido, uma vez revogada a lei concessiva deste benefício os tributos – cujos fatos geradores tenham ocorridos após a vigência da norma revogadora da isenção – poderão ser exigidos novamente, imediatamente, não havendo que se falar aqui em eficácia retroativa.
- Já para os adeptos da segunda corrente, que entendem a lei isentiva como subtração de parcela de eficácia da regra-matriz de incidência do tributo, com a revogação do incentivo fiscal, há em verdade uma nova instituição (reinstituição) do tributo. Como se está diante de tributação nova, deve o tributo respeitar o princípio da anterioridade, caso aplicável. Assim, revogada isenção de uma determinada espécie tributária e não sendo esta exceção às anterioridades previstas na CRFB, a autoridade fazendária competente deverá esperar o exercício financeiro seguinte para que possa reiniciar sua cobrança.
Contudo, deve-se manter em mente que, conforme já explicado acima, o Supremo Tribunal Federal, atualmente, filia-se à primeira corrente e entende que como há mera dispensa legal de pagamento de tributo, a revogação de norma isentiva possui efeito imediato, permitindo a cobrança referente aos fatos geradores que lhe são posteriores no mesmo exercício financeiro.
Todavia, o moderno entendimento da segunda corrente ganha cada vez mais corpo e novos adeptos, especialmente por ser um entendimento mais vantajoso para os contribuintes, que não se veriam surpreendidos com o retorno de uma cobrança, ainda no mesmo exercício, por conta de revogação da norma isentiva.
- Isenção de tributos sobre veículos para Pessoas com Deficiência (PCD) / Autismo: Aspecto Socioeconômico da Isenção Tributária na prática.
Conforme registrado anteriormente, a análise da função socioeconômica de uma isenção tributária é requisito de sua validade. E, a instituição de isenção para pessoas com deficiência pelo legislador federal e também pelos legisladores estaduais está em perfeita consonância com esse princípio.
Segundo a Organização Mundial de Saúde – OMS[3], com dados de 2011, 1 bilhão de pessoas vive com alguma deficiência – o que corresponde a uma em cada sete pessoas no mundo. E, outras 70 milhões, possuem Transtorno do Espectro Autista.
No Brasil, segundo dados do CENSO[4] 2010, cerca de 46 milhões de pessoas possuem alguma deficiência, o que correspondia, à época, a aproximadamente, 24% da população. Além de existirem cerca de 2 milhões de autistas no país.
No âmbito federal, é a Lei n. º 8.989/95 que dispôs sobre a isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI na aquisição de automóveis para PCD, enquanto que a Lei Federal n. º 8.383/91 dispôs sobre a isenção do Imposto sobre Operações Financeiras – IOF na aquisição de automóveis para PCD, devendo-se atentar para as disposições da Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil (INRFB) n. º 1.769/2017.
No que se refere aos Impostos Estaduais, especialmente ICMS e IPVA, ante a autonomia de cada uma das Unidades Federativas é necessário se atentar para a legislação própria de cada Estado, especialmente em relação aos procedimentos administrativos necessários para a concessão do benefício fiscal.
Em Minas Gerais é a Lei Estadual n. º 6.763/75 que estabelece a Legislação Tributária do Estado, a qual determina em seu art. 7º, XXV, que não incide os impostos de competência estadual sobre veículo automotor adquirido por PCD, nos termos do Convênio ICMS n.º 38/2012 do Conselho Nacional de Política Fazendária – CONFAZ, celebrado e ratificado pelos Estados, devendo-se atentar o requerente do benefício as regras administrativas instituídas pelas respectivas Secretarias de Estado das Fazendas Estaduais – SEFAZ.
É importante esclarecer que as pessoas acometidas pelo Transtorno do Espectro Autista são consideras, para todos os efeitos legais, pessoas com deficiência, consoante determina a Lei n. º 12.764/2012 em seu art. 1º, §2º.
Assim, a princípio, pessoas com deficiência são beneficiadas com a isenção de impostos federais (IPI e IOF) e estaduais (ICMS e IPVA). Entretanto, as exigências administrativas para comprovar a legitimidade para concessão do benefício variam conforme o tributo analisado e também com a condição de beneficiário condutor ou não condutor. O preço final do veículo 0KM, com as isenções, pode ter abatimento de até 30%. E é isso mesmo que você leu! Pessoas com deficiência menores de idade – e, portanto, não habilitadas –, também fazem jus a determinados benefícios.
Como se verifica, as isenções sob análise podem ser classificadas como isenções especificas, ou seja, para sua concessão é necessário que autoridade administrativa responsável pela fiscalização e pelo recolhimento dos tributos analise o preenchimento das condições especificas.
Em síntese, as pessoas com deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou autistas podem comprovar sua condição para gozar do benefício fiscal por meio de: i. Laudo de avaliação emitido por prestador de serviço público de saúde, por serviço privado de saúde, contratado ou conveniado, que integre o Sistema Único de Saúde (SUS), pelo Detran ou por suas clínicas credenciadas, ou por intermédio de serviço social autônomo, sem fins lucrativos, criado por lei, caso não tenha sido emitido laudo de avaliação eletrônico; e ii. Certidão de nascimento atualizada do beneficiário, na qual esteja identificado o seu responsável legal, no caso de requerimento transmitido por tutor ou curador.
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Bibliografia:
Paulsen, Leandro. Constituição e Código Tributário Comentados à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. 18ª ed. Saraiva. 2ª Tiragem 2018.
Paulsen, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 10ª ed. Saraiva. 2019. pág. 277-281.
Sabbag, Eduardo. Manual de Direito Tributário. 10ª ed. Saraiva. 2018. pág. 1037 – 1054.
[1] Crédito tributário é um valor que o sujeito ativo, o Estado, pode exigir do sujeito passivo, o contribuinte ou responsável. Essa cobrança é decorrente de uma obrigação tributária, e é constituída após o lançamento. É preciso três requisitos para que o crédito tributário exista: sua previsão em lei, o fato gerador e o lançamento do tributo.
[2] Doutrina. É um conjunto de princípios, ideias e ensinamentos de autores e juristas que, no caso, servem de base para o Direito e que influenciam e fundamentam as decisões judiciais. É fonte do Direito, utilizada também para a interpretação das leis, fixando as diretrizes gerais das normas jurídicas.
[3] https://nacoesunidas.org/acao/pessoas-com-deficiencia/
[4] https://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cpd/documentos/cinthia-ministerio-da-saude
Censo ou recenseamento demográfico é um estudo estatístico, normalmente realizado a cada 10 anos [censo 2020 ainda não foi feito] referente a uma população que possibilita o recolhimento de várias informações, tais como, o número de homens, mulheres, crianças e idosos, onde e como vivem as pessoas, além de outras informações.